Discurso contra a vigília dos “opositores da vacina” – chega de murmúrios de conspiração antissemita!, 17 de Abril de 2021.
de Lothar Galow-Bergemann
Original in deutsch – Mit Dank für die Übersetzung an Krisis – Crítica da sociedade da mercadoria
Juntamente com a pandemia de Covid-19, estão se espalhando fantasias de conspiração perigosas e assustadoras. As pessoas falam sobre planos secretos de bilionários malvados para lhes implantar microchips e uma “ditadura de Merkel” agindo em nome deles. A crença de que estão à mercê de forças obscuras malignas, gananciosas e inimaginavelmente poderosas, está tão arraigada nelas quanto a convicção de que elas próprias são uma resistência legítima. Com uma frequência cada vez maior, exprime-se um antissemitismo aberto, que pressupõe “os judeus” como os verdadeiros controladores do mal.
Infelizmente, não se pode dizer que o que estamos assistindo atualmente nas manifestações dos alegados “pensadores laterais” (Querdenker) não tem nada a ver com o resto da sociedade. Porque, o mais tardar desde a crise financeira e econômica de 2008, muitas pessoas acreditam que “a culpa é toda dos que estão por cima”. A crítica social confunde-se com a raiva dirigida aos “multimilionários gananciosos”, ao “pacote de mentiras” e à “imprensa mentirosa”. Isso funciona nos meios da direita, esquerda e “alternativos”, bem como no pretensamente bom “centro” da sociedade.
Há, no entanto, muito bons motivos para críticas razoáveis na crise da Corona. Pois esta crise é apenas em pequena medida um fenômeno natural. Em primeiro lugar, é a consequência doméstica de uma economia que, sem crescimento constante e lucro máximo, começa imediatamente a desabar. Não por causa do vírus, mas devido a esta economia, massas de pessoas estão morrendo em regiões do mundo “insolventes” sem vacinas, milhões caem na pobreza e na fome em todo o mundo. Mesmo nos países mais ricos, aumentam a pobreza e a incerteza quanto à subsistência, muitas pessoas têm de ir trabalhar e infectarem-se umas às outras. Muitos adoecem e morrem apenas porque esta economia não pode realizar um lockdown adequado.
É pena que até agora quase não exista resistência contra essas impertinências. Uma iniciativa como a ZeroCovid, que exige um lockdown solidário – mas real, onde não precisamos nos espremer nos trens para que as linhas de montagem da Daimler continuem funcionando – tal iniciativa praticamente não recebeu atenção até agora. Sua demanda por “três semanas de licença especial remunerada agora” vai na direção certa. Mas por que apenas 100 pessoas comparecem a tal manifestação? E não seria uma tarefa dos próprios sindicatos exigir precisamente isso agora? – Por que não há greves para forçar o fechamento de empresas não imediatamente essenciais? Onde estão as demonstrações para a abolição da proteção de patentes das vacinas?
Em vez disso, as pessoas que estão se manifestando não criticam a falta de firmeza (Halbherzigkeit) e a inconsistência das medidas estatais de proteção da saúde, mas exigem absurdamente o seu fim. Ignorando completamente a realidade, eles negam ou minimizam a pandemia, comportam-se de forma irresponsável e põem em perigo a saúde e a vida de seus semelhantes – e a sua própria.
Por que quase não há protestos razoáveis, mas tantos protestos absurdos? Por que um número crescente de pessoas acreditam em bobagens assustadoras? Por que a educação e a inteligência não as tornam imunes a isso? E por que pessoas que na verdade não tem muito em comum estão reunidas? Esoterismo alternativo e adeptos do capitalismo liberal econômico, nazis e hippies, esquerdistas e cidadãos do Reich, classe média e anti-autoritários…
Eles todos estão convencidos de que são enganados e oprimidos pela “elite”. E o que eles têm em comum são concepções errôneas a respeito do capitalismo. Alguns o consideram o melhor e mais natural de todos os mundos e, portanto, acreditam que as crises só podem ser causadas por pessoas incompetentes e perversas. Os outros consideram que o capitalismo é, desde o início, obra dessas pessoas. Seja qual for o caso, eles concordam quanto à conseqüência.
As causas sistêmicas irrefletidas levam as pessoas à interpretação personificadora da crise. A crença de que as forças obscuras são culpadas pela injustiça, doenças, miséria, guerra e crises tem uma tradição de quase dois mil anos no anti-judaismo cristão. O antissemitismo moderno, para o qual “o judeu” é a personificação do mal por excelência, deu continuidade a isso sem problemas. Não é coincidência que as atuais fantasias conspiratórias sejam novamente permeadas por padrões de pensamento antissemitas e que o antissemitismo se manifeste cada vez mais abertamente. A história ensina que ele pode se espalhar furiosamente em tempos de crise. Auschwitz, na ideia delirante da maioria dos alemães, foi a eliminação da ganância fraudulenta em nome dos que trabalhavam honestamente.
Não compreender o capital, mas atacar as consequências do capitalismo é como estar em uma prisão da qual nada se sabe. O surto coletivo desses presos é alimentado por uma conspiração irracional misturada com o medo perfeitamente justificado com relação à própria subsistência. Esse medo, no entanto, tem razão de ser, pois a crise do Corona, assim como a crise climática, revela que o sistema econômico dominante não está à altura dos desafios existenciais. O crescimento ilimitado é mais importante para ele do que as pessoas e a natureza, o lucro máximo mais importante do que a saúde e a qualidade de vida, o aumento do preço das ações mais importante do que a vida das gerações futuras. Este sistema econômico nos levou ao beco sem saída no qual estamos agora. Precisamos de um modo diferente e mais sensato para nos administrarmos, que possa fechar durante uma pandemia sem causar um sofrimento ainda maior. E precisamos de um amplo movimento social que exija isso.
Tradução: Marcos Barreira
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